Manaus, 25 de abril de 2024

Geral

Foto: Arquivo da Família
Foto: Arquivo da Família Foto: Arquivo da Família

Acusado de matar trans no AM tem parecer favorável para responder em liberdade e caso revolta família e amigos

A artista Manuella Otto foi morta com um tiro em fevereiro, em Manaus.

Por Stephane Simões e Eliena Monteiro

O Ministério Público do Amazonas (MP-AM) deu parecer favorável para que o policial militar Jeremias Costa da Silva, principal suspeito da morte da trans Manuella Otto, responda o processo em liberdade. A advogada de defesa da vítima, Katri Florêncio, se manifestou contra a decisão e busca pela manutenção da prisão preventiva do suspeito. A família e amigos de Manuella Otto ficaram revoltados com a possibilidade do PM responder pelo crime em liberdade.

Manuella foi morta com um tiro no tórax, em um motel, no bairro Monte das Oliveiras, Zona Norte de Manaus, no dia 13 de fevereiro deste ano. O principal suspeito do crime é o cabo da Polícia Militar (PM) Jeremias da Costa Silva. Ele foi preso preventivamente pela Delegacia Especializada em Homicídios e Sequestros (DEHS), no dia 18 de fevereiro.

Manuella foi morta com um tiro no tórax. Foto: Arquivo da Família

Segundo a advogada da família de Manuella, no dia 20 de maio, a defesa de Jeremias Costa da Silva pediu a substituição da prisão preventiva para que ele aguarde o julgamento em liberdade. A defesa do policial militar alegou insanidade mental permanente do suspeito.

“No dia 25/05, o MP deu parecer favorável à soltura de Jeremias Costa da Silva. Em síntese, o órgão sustenta que, apesar das provas de autoria e materialidade do crime, a prisão preventiva é medida extrema, devendo ser adotada apenas em casos extremos. Pelo entendimento do MP, o assassinato de uma mulher transexual não é grave o suficiente para manter o acusado preso, mesmo havendo provas incontestáveis de que ele foi o autor do crime”, disse Katri Florêncio ao Portal Edilene Mafra.

Para a advogada, a medida que o MP-AM solicitou é aplicada em casos “singelos”, como roubos e estelionatos, e não em crimes graves e nas circunstâncias em que Manuella foi morta.

“Fiquei indignada ao ler o parecer do MP. Segunda-feira [31/5], protocolei minha manifestação discordando totalmente do órgão ministerial, pois, o meu entendimento, enquanto advogada, é que permanecem todos os pressupostos legais que autorizam a manutenção da prisão preventiva”, afirmou.

Família e amigos se revoltaram com parecer do MP. Foto: Arquivo da Família

Conforme Katri, o MP-AM afirma que o suspeito tem condições favoráveis que autorizam a sua liberdade, como laços familiares, residência fixa e trabalho. O parecer afasta indícios de que ele possa praticar outros crimes, de fuga ou de que o acusado possa colocar em risco a aplicação da lei penal.

“Com base nisso, o MP pediu aplicação de outras medidas como a proibição de se ausentar da comarca, utilizar tornozeleira eletrônica, proibição de frequentar bares, motéis ou locais congêneres, recolhimento domiciliar no período noturno entre 20h e 6h. Ou seja, durante o dia ele estará livre para andar nas ruas”, acrescentou a advogada.

De acordo com Katri, o processo foi enviado para o juiz da 2ª Vara do Tribunal do Júri, que analisará todos os pedidos, para, assim, decidir se autoriza a liberdade ou se mantém o suspeito preso.

“Jeremias escolheu deliberadamente tirar a vida de uma mulher trans. Escolheu de forma totalmente aleatória um tipo específico de vítima: mulher trans. Ele permanece sendo um perigo potencial à sociedade. A liberdade dele põe em risco a vida de outras mulheres trans. A família, amigos, e eu, advogada da Manu, clamamos para que o Jeremias não seja solto, para que a justiça seja feita!”, falou.

Para a advogada não há dúvidas de que o caso trata-se de um crime transfóbico, pois Jeremias nunca tinha tido contato com Manuella ou com qualquer outra pessoa de sua família. A vítima morreu por choque hipovolêmico, em razão de hemorragia aguda provocada pelo projétil.

“Ele sabia, sim, que a Manu era trans. Ele atraiu, marcou um encontro, carregou sua arma, levou ela para a privacidade de um quarto de motel e, após a conjunção carnal, deu um tiro na região do tórax, que atravessou seu peito. A identidade de gênero da Manuella influenciou até no modo que ele agiu, no modo que ele praticou o crime. Ele não tinha nenhum outro motivo para justificar o crime, eles sequer se conheciam”, finalizou a advogada.

Live

No último sábado (5/6), Lucas Picanço, amigo da vítima promoveu a live #justiçapormanuellaotto. Além de fazer alusão a junho, mês do Orgulho LGBTIA+, o evento reuniu amigos e familiares que manifestaram revolta pelo parecer do MP.

A transmissão, realizada pelo Instagram, contou com a participação da mãe de Manu, Hylma Silva.

Hylma disse ser contra liberação do acusado para responder pelo crime em liberdade. “Eu peço a vocês que a gente se una”, afirmou. “Se isso aconteceu, não vai parar por aí. Eu quero justiça, justiça”, concluiu.

Ministério Público

A redação entrou em contato com o MP-AM, para solicitar posicionamento da instituição sobre o caso. O órgão informou que ofertou denúncia do caso à Justiça do Amazonas. “Que foi devidamente recebida pelo Judiciário, assim, o autor passa a ser réu de ação penal de competência do Júri”, destacou o Ministério Público.

Em relação ao pedido de liberdade, o MP afirmou que o autos estão sob análise judicial. “Em razão do sigilo judicial decretado, qualquer outra informação não será possível de ser fornecida, a fim de preservar as partes envolvidas, aí incluídos o réu e os familiares da vítima”, disse o órgão.

Manu, de preto, era artista e criou companhia de animação de festas. Foto: Arquivo da Família

Trans era artista

Natural de Manaus, Manuella Otto era artista e criadora da Companhia Magia das Fadas. Segundo a mãe de Manu, Hylma Silva, 41, a transexual sempre teve paixão pelas artes e cultivava muitos planos.

Em fevereiro deste ano, Hylma contou que Manuella já nasceu artista. Sempre foi uma pessoa muito extrovertida, gostava de aproveitar a vida e amava crianças. Ela tornou-se trans em 2015.

“Estava sempre alegre, rindo, bagunçando comigo e com o irmão. Quando as minhas sobrinhas vinham pra cá, a Manu virava uma criança. Ela gostava muito de crianças”, lembrou a mãe. Saiba mais aqui.

COMPARTILHE

error: Este conteúdo está protegido!